Liquidez no mercado privado

Um dos maiores desafios do mercado privado de investimentos está na liquidez dos ativos

Autor: Camila NasserFonte: A Autora

Um dos maiores desafios do mercado privado de investimentos está na liquidez dos ativos. Especialmente no contexto em que as empresas estão levando mais tempo para abrirem capital - e com a grande maioria ainda ficando fora do mercado público durante toda a vida - as saídas via Ofertas Públicas na bolsa e via aquisições estratégicas (seja em M&As ou via PE) são canais insuficientes de liquidez para os mais de R$ 544 bilhões movimentados no mercado privado em 2022.

Precisamos de uma consolidação de ambientes para transações secundárias que envolvam um público vasto, que alcancem a poupança popular e seus agentes. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) parece ciente do desafio, tanto que permitiu às plataformas de crowdinvesting a organização de um ambiente de negociação para que investidores possam transacionar ativos entre si.

A autorização regulatória limita as listagens a empresas que realizaram ofertas públicas via plataforma, e limita a negociação a investidores ativos da plataforma. Apesar deste ter sido um passo muito importante para validar a capacidade do mercado de se organizar com segurança, não será apenas através dessas autorizações que o problema de liquidez no mercado privado será resolvido.

O mercado de crowdfunding de investimento tem sido mesmo uma espécie de ambiente de testes para a CVM, por abrigar agentes inovadores e ser um dos pontos de entrada desses agentes ao mercado de capitais. Para que o experimento seja bem sucedido e nos leve para um mercado de capitais com maior liquidez, as plataformas precisarão ultrapassar barreiras comuns do mercado de capitais, como a assimetria de informações entre emissora mais seus agentes e o público investidor; ou como distorções no processo de formação e preço, tanto as típicas de um mercado incipiente e de volumes modestos, quanto aquelas causadas por agentes maliciosos.

Assim, serão necessários parâmetros mínimos de governança e transparência para orientar as emissoras listadas, como a obrigação de divulgação de dados contábeis e gerenciais, bem como de publicizar termos-chave de rodadas de captação subsequente, considerando que a formação de preço dos papéis de uma emissora podem em muito ser influenciados pelos valuations marcados ao longo de sua vida.

Para contornar problemas na formação de preço, é necessário incluir mecanismos de proteção desse processo, como balizas de interrupção de negociações em alguns cenários, além de ferramentas de fiscalização e controle do influxo de ordens, por exemplo, artificiais.

O caminho rumo a essas salvaguardas deve ser baseado tanto na regulação, pela CVM, quanto em mecanismos de autorregulação.

Com a possibilidade de liquidez, o mercado de crowdfunding entrará em sua primavera, com aumento na adesão de investidores e impulso nas ofertas públicas primárias. Devemos ver cada vez mais investidores institucionais co-investindo com plataformas, e rodadas de negócios mais robustos.

Desde que fundamos o Kria, a plataforma pioneira do Brasil, um dos principais questionamentos de investidores era sobre a liquidez e janelas de saída. Agora, quando completamos a primeira década do mercado, ela chegou a passos lentos, e estamos no momento de acelerar.

Agradeço ao Gustavo Rodriguez, do time jurídico do Kria, pela colaboração neste artigo.


*Camila Nasser é cofundadora e CEO do Kria, que é uma plataforma de investimentos em startups. A executiva iniciou sua carreira profissional no universo financeiro no Kria, como estagiária, ainda na época de faculdade. Ao longo dos anos, assumiu importantes cargos de liderança, como Head de Marketing e Chefe de Operações. No final de 2020, foi convidada para se tornar CEO da fintech. Camila é graduada em comunicação pela ESPM - Escola Superior de Propaganda e Marketing, em São Paulo.

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